Isso explica-se pela dispersão e descaracterização de grupos étnicos assimilados pela globalização, pelas culturas naturalmente “corrompidas” nos seus aspectos idiossincráticos, pela “efervescência” da quantidade de informação, que irradia de forma exponencial e em incompatibilidade com a necessidade da introspecção e autoconhecimento, fundamentais para um equilíbrio emocional do ser humano e da conscientização, espiritual, social e antropológica, da sua identidade. Na verdade, essa amalgama de conhecimentos, tecnologia, possibilidades e informações que tenderiam a melhor esclarecer cada ser humano no que respeita à sua identidade individual e psicossocial, mais se mostra como um amplo vácuo, que se alastra como que impregnado no próprio universo em expansão, repleto de múltiplas interrogações, indefinições e receios.
Algumas das manifestações desse quadro, estão ilustradas no comportamento arbitrário e inseguro de muitas pessoas inteligentes, sensíveis, mas fragilizadas pela dificuldade de introspecção, pela dificuldade da assertividade das suas escolhas, da obtenção da eficácia das suas ações e da irregularidade do humor ou imprevisibilidade do temperamento. A dificuldade de ter uma maior consciência do seu “eu”, autônomo e responsável gera uma sutil e solitária agonia, traduzida na instabilidade emocional, de quem não sabe (ou não quer) pedir ajuda. Em alguns casos sob a influência ou predominância de um Ego inflado que se exibe, autoritário, combatendo de forma mais ou menos inconsciente o vislumbre de uma rendição, que se poderia mostrar emocionalmente suicida e trazer descobertas aterrorizantes.
Nesses casos é como que um “instinto” de sobrevivência que comanda as operações, levando a pessoa a tornar-se desmedidamente ativa e envolvida com coisas, muitas coisas, que quase sempre não levam a lugar algum e a afastam de forma abismal, de si própria. Para além da necessidade da pessoa se sentir ocupada e operacional, outros sintomas, são a necessidade de se sentir útil, justa e admirada, solidária e guerreira, dissimulando qualquer início de incapacidade, incompetência, dificuldade ou fragilidade, que desse modo é ilusoriamente afastado, pelo recorrer a um comportamento permissivo, subserviente, o que na verdade nada mais é do que a manifestação do desconhecimento de si mesma.
Estas pessoas, muitas vezes iludidas por uma significativa formação acadêmica, ou suposta experiência de vida, não têm, em muitos casos, a percepção do desajuste do seu comportamento e da ineficácia das suas ações. Apenas sofrem como que submetidas a um terrorismo emocional que afinal elas mesmas edificam. Para quem observa, parecem os “bobos” da sociedade, que é predominantemente implacável na sua postura para com esse tipo de perfil, mesmo porque precisamos do mal dos outros, para nos acomodarmos na nossa ilusória e insípida felicidade.
Esta não é uma abordagem apologista do pessimismo, e da crítica barata. É isso sim, um incisivo alerta para uma reflexão, num primeiro momento e um partir para a ação em sequência, para a reivindicação de uma inversão desse quadro, protagonizado pelo usufruto das nossas reais e ilimitadas capacidades.
Olhe à sua volta, com alguma atenção e encontrará pessoas assim. Talvez mais do que poderia imaginar. Ofereça, escuta, compreensão, sem julgamento nem despotismo. Não dê conselhos, dê atenção e disponibilidade. Dê amor incondicional (depois de entender o que isso é). Lembre-se, muito provavelmente a pessoa nem sabe que precisa nem aceitará a sua ajuda. Apenas mostre a sua serenidade e escolha estar bem e sobretudo fazendo muito bem a sua parte (o que é o mesmo que dizer, assumir a sua responsabilidade em todos os aspectos da sua vida). Desse modo ela irá entender que também pode atingir tudo isso. E é pela conscientização dessa nova realidade que pode surgir a vontade de mudança. Porque ninguém muda para um caminho que não vislumbra.